segunda-feira, dezembro 04, 2006

Louvor à vida!

por João Titta Maurício *

Apesar das dificuldades com que, a todos e todos os dias, o Tempo e a Natureza nos testam, ninguém po-de negar que haja provado o prazer e a Felicidade. Porque, não obstante a presença recorrente da infelicidade, da dor ou da provação na História da Humanidade e de cada homem, também sabemos que a desistência e o conformismo não são o modo mais adequado de viver. Nem sequer o mais confortável. E muito menos o mais de-sejável.

Pois há sempre um momento em que percebemos que “tudo valeu a pena”. Até na dor e até no sofrimento. Até no risco e até na Esperança... pois se é verdade que a Felicidade tem um preço, uma perda, um sacrifício, também é certo que a vida carece desse travo amargo a sal, que nos permita temperar e sentir o prazer de viver, vencer e ser Feliz. E é nesse instante de alegria, por mais pequeno que seja, que descobrimos a certeza da ordem perfeita do mundo.

Porém, nem sempre a essa ordem perfeita corresponde uma Felicidade perfeita e permanente. Pois não. Mas isso não é consequência de outra vontade que não a do Homem. Pois a infelicidade resulta do uso indevido, egoísta, cego, estúpido do Livre Arbítrio, É a consequência necessário de um exercício da Liberdade ao serviço de uma vontade que baralha conveniência com verdade, que confunde desejo com necessidade.

Através de uma subtil e quase insentida coacção manipuladora, disfarçada de "caminho indispensável para o Progresso", tem-se vendido uma versão recauchutada do velhíssimo (e bastas vezes desmentido) "determinismo histórico", o qual impõe uma «autocoisificação dos homens» (Jürgen Habermas), talvez inconsciente, mas apresentada como a única e necessária acção racional.

É essa a realidade presente da civilização ocidental, na versão apodrecida a que os abortistas nos querem fazer aderir: uma «sociedade totalitária de base racional» (Herbert Marcuse), tanto mais traiçoeira quanto a manuten-ção da dominação esconde-se pela utilização mediática e massiva de argumentos decorrentes de imperativos técni-cos, científicos e estatísticos – os únicos que por eles são admissíveis e perante os quais deve tudo o mais ceder!

Mas é também um «condicionamento da Liberdade» (Paulo Otero) consequência da vontade de alguns nos conduzirem à «redefinição dos comportamentos humanos» (Paulo Otero) procurando impor soluções legislativas que, proporcionando a subversão da tradicional distinção entre pessoa e coisa, se tornam instrumentos de negação da humanidade do Homem.

Este é um cenário da "Democracia sem valores", onde, em nome de uma modernidade desumanizante, se pretendem impor soluções legislativas que favorecem "rédea solta" aos impulsos, à tentativa de relativização do humano e ao domínio absoluto sobre a Natureza e o Homem.

É um evidente fenómeno de "despolitização", onde o progresso técnico é «fonte de servidão» (Paulo Otero) e ata-que à política, pois que pretende impedir as escolhas políticas, tornando-as em simples processo de resolução de questões técnicas. O representante, o legislador, o decisor não age livremente pois que a sua decisão é já condi-cionada pela "revelação" que nos é apresentada pelo corpo tecnocrático da Nação: decidir em sentido diverso, ain-da que fundamentadamente, é tratado pela "inteligentzia tecnocrática progressista" ao nível de moderna "here-sia", a qual só pode ser debelado através da sempre reparadora "fogueira" da censura do "political correctness"!

O Estado não pode abdicar de assumir uma concepção ética de defesa do ser humano e da sua integral dignidade. A simples reivindicação de uma posição de neutralidade perante os atentados contra a pessoa humana será já uma renúncia do Estado a ser Estado. Em boa verdade, a neutralidade do Estado em termos éticos nunca se revela neutra pelos respectivos efeitos concretos que proporciona: a neutralidade na tutela da Vida hu-mana e na garantia da dignidade da Pessoa mostra-se sempre política e axiologicamente comprometida com a concepção desvalorizadora dessas mesmas tutelas e garantia. Uma postura de neutralidade ética por parte do Estado, revelando a concepção de um Estado sem valores (expressão de uma efectiva absolutização da Liberda-de aliada à "desideologização" do Estado - que, por essa via, perde qualquer critério de conformação social), con-duziria a uma sociedade em que tudo é permitido, na qual se destruiria o Homem e a própria razão de ser do Estado: sem a preocupação de defender a vida humana e a inalienável dignidade do Homem, o Estado conver-ter-se-à numa mera instância de «solução de tarefas técnicas».

Em tais casos, um modelo tradicional de Estado totalitário poderá mesmo ser substituído por um «totalita-rismo sem Estado» (Paulo Otero): a omissão e o Estado na garantia da tutela da vida humana e na garantia da dig-nidade de cada ser humano poderá mostrar-se tão atentatória da pessoa humana quanto um modelo de Estado empenhado por acção na destruição do indivíduo. O totalitarismo surgirá aqui por via da inércia do Estado na defesa da pessoa humana.

Resta, pois, resistir!

Aos cidadãos do presente, pelo Presente, pede-se que saibam que há assuntos que não podem ser usadas como instrumentos de táctica. E aos cidadãos do presente, pelo Futuro, exige-se que – com acrescido sentido de responsabilidade – assumam como suas as tarefas de impor e exigir elevados padrões e limites éticos à acção do Estado.

Neste momento em que se pretende vender o aborto como um sinal de modernidade, mas principalmente porque estou de luto pela morte da minha avó – e uma avó é duas vezes mãe –, mais do que condenar os pretensos “modernos”, prefiro louvar os que ousam continuar a tradição do amor das mães, do carinho das mães, da dedicação sem limites das mães. Deixo-vos, assim, um poema de Lopes Morgado, intitulado "Mulher Mãe". Deixo-o aqui, por mim dedicado a todas as mulheres. A todas! Às que podem ser mães… às que não podem ser mães… às que querem ser mães… às que ainda não descobriram o carácter ilimitado do Amor de mãe… e às que já são mães.

Só por isso, Mãe

Mesmo que a noite esteja escura,

Ou por isso,

Quero acender a minha estrela.

Mesmo que o mar esteja morto,

Ou por isso,

Quero enfunar a minha vela.

Mesmo que a vida esteja nua,

Ou por isso,

Quero vestir-lhe o meu poema.

Só porque tu existes,

Vale a pena!

segunda-feira, novembro 27, 2006

Em defesa da Vida humana... ponto!

As leis devem reflectir e proteger os padrões morais de uma sociedade, porque é assim que se mantém o tecido social e se alcançam os equilíbrios indispensáveis. Ora, não é por acaso que as esquerdas usam do poder que por vezes lhe é concedido pelo voto (e quando não o têm, usam e abusam do domínio que lhes é permitido nos media e na rua) e, sempre que podem, recorrentemente bombardeiam-nos com campanhas destinadas exclusivamente a atacar e negar a validade dos padrões éticos que permitem distinguir o Bem do Mal. É por isso que hoje a sociedade ocidental navega ao acaso, pois as esquerdas têm sido bem sucedidas: aproveitando o voto que beneficiam em função do estímulo da inveja e depois aplicam-no em campanhas de intoxicação e de apelo ao relativismo ético para levar a cabo as suas propostas legislativas (ditas) fracturantes.

Parece pouco consistente e esclarecido quem afirma que «se a direita quiser ser genuinamente liberal, deve promover a tolerância dos usos e costumes». Assim, chegámos a uma situação onde as Virtudes já não são conhecidas e reconhecidas; e os valores (seus substitutos operativos) são “de geometria variável”. Porém estes (porque não fundacionais) são desprovidos de Autoridade e, por isso, susceptíveis de serem desobedecidos. O resultado é a indiferença e o relativismo reinantes!

Mal anda uma certa direita que se julga “arejada” quando afirma que «o Estado não pode colocar-se numa posição de “árbitro” de gostos, opções ou moralidades». O Estado não é árbitro, antes é executor e defensor do modelo maioritário consensual. O Estado não pode optar por moralidades. Mas também não deve rejeitar ou tentar substituir a Moral consensual, ampla e historicamente aceite e que demonstrou ser a mais adequada. A legislação deve reflectir a noção colectiva de Bem e não acolher uma solução que, não enquadrando no sentir abstracto geral apenas serve de alívio pessoal de consciências, Pelo contrário: o Estado não pode aspirar à neutralidade que não é possível, antes deve constituir-se no seu primeiro instrumento de defesa.

«A tradição, é elo que ata e harmoniza o Passado com o Presente, é o vínculo que liga o Passado ao Futuro»

Camilo Castelo Branco

Se abandonar a defesa da Moral maioritária (não obstante esta pretender defender os mais fracos e aqueles que mais precisam), havendo concorrência (e zonas e momentos de conflito), ao Estado restar-lhe-à escolher entre morais concorrentes. Com base em que hierarquia de valores?

Aliás, não parece Liberalismo mas é puro Individualismo afirmar que «o Estado deve inibir-se de legislar sobre os assuntos que apenas respeitam à moralidade e a comportamentos individuais que em nada afectam o bem-estar e a segurança da comunidade». Primeiro, não é o Estado que legisla: é a sociedade! Segundo, a questão do aborto é uma questão de comportamento individual inaceitável, porque causa dano em terceiros que, apesar de terem uma capacidade jurídica de exercício diminuída (e que por isso deve ser, em seu nome, exercida por quem a Sociedade delega esse direito/dever: nos pais), têm um direito tutelável (a Vida). Finalmente, sobre a tutela da vontade individual manifestada pela mulher neste casos, parece-me ser de considerar que, tratando-se de uma manifestação de vontade por parte de alguém que se encontra extremamente perturbado e sobre pressão, por ser matéria de relevância jurídico-penal, deve justificar que se levantam seriíssimas dúvidas ou cautelas à sua aceitação.

É certo que «o Estado nada tem que ver com as nossas vidas pessoais nem deve intrometer-se no exercício das nossas escolhas e liberdades». Mas (e ultrapassando a questão da dicotomia Estado/Sociedade), se parece óbvio que as escolhas individuais são da exclusiva responsabilidade de cada cidadão, natural também é que se entenda que estas devam operar... dentro dos limites morais/legais acolhidos pela Sociedade. O apego (individual e livre) às virtudes da Tolerância e do Pluralismo são comportamentos (individualmente) sadios e imprescindíveis numa sociedade Liberal. Mas não exigem que, os que os cultivam, se dediquem a criar condições para... o vazio e o relativismo moral!

A Democracia liberal, a governação não assistida de uma comunidade, o auto-governo dos indivíduos, pressupõe que todos os seus componentes respeitem, cumpram e façam cumprir a ética da responsabilidade fundadora do modelo civilizacional a que pertencem. Deste modo, o modelo demo-liberal, para funcionar, requer cidadãos morais, isto é, que cada um actue de acordo com os padrões de comportamento conhecidos e aceites pela comunidadeporque são eles que a fundam. E (muito importante) que esses cidadãos sejam actuantes e vigilantes, isto é, que cuidem que os desvios ao comportamento padrão sejam denunciados e efectivamente punidos. Foi para isso se criou a lei, para suportar uma moral enformadora e fundacional de uma comunidade, para não só garantir o seu funcionamento mas, também, para obviar à sua destruição.

Por outro lado, é uma artifício intelectualmente pouco sério afirmar que quem defende a Liberdade da Economia face à intervenção do Estado, não pode deixar de reclamar o mesmo para a questão do aborto. Ninguém defende que o Estado seja afastado da “economia”, mas que se abstenha de intervir como agente económico e se dedique a regular e fiscalizar o cumprimento das regras indispensáveis à Liberdade (leia-se, “concorrência). Todavia, é evidente que para garantir o bom funcionamento da economia de acordo com regras... a sua existência pressupõe a existência de uma valoração ética sobre os comportamentos: exige-se que estas sejam compatíveis com a hierarquia de valores operante na sociedade e que, por isso, sejam previamente conhecidas (assim se afastando a coercibilidade arbitrária e ilegítima)!

«A Liberdade só pode ser exercida quando os cidadãos submetem o seu comportamento a limites, pois não há Liberdade sem regras legais e de conduta».

Friederich von Hayek

Além disso, Liberdade não é o direito de se fazer o que se quer, mas o direito a não se obedecer à vontade arbitrária e coercivamente imposta por outros. Assim, a abstenção de intervenção do Estado significa que este se deve inibir de impor comportamentos, não significa que deva admitir ou acolher todos os comportamentos. Pelo contrário, deve impedir e sancionar aqueles que violem o quadro de valores sancionado pela Sociedade. Principalmente quando estes se pretendem impor a terceiros indefesos.

Mas há quem, fiel aos Princípios, não desiste. E resiste!

por João Titta Maurício

segunda-feira, novembro 20, 2006

Em defesa da Vida!


Na questão do aborto, lamentavelmente, muitos são os que já se renderam às facilidades argumentativas e que, julgando ser possível lucrar com lealdades menores, cederam às conveniências de um certo “modismo” intelectual pouco elaborado e nada novo.
Porém, porque tenho suficiente confiança nas Virtudes que professo e escolhi viver, opto por rejeitar as facilidades da “modernidade”, mesmo quando tal decisão surja como susceptível de trazer desvantagens pessoais ou até privar-me de excelsas glórias que não procuro.

Já aqui afirmei que ligar a Vida e a Felicidade futura de uma criança por nascer ao presente difícil dos pais, seria condenar quase todas as crianças ao não nascimento! Ou até poderia justificar um recuperar do direito de livre disposição da vida dos filhos por parte dos pais. Porque já foi assim!

Também creio ter já demonstrado a falácia da conclusão que tem como pressuposto argumentativo “o corpo pertencer à mulher!”. Apenas acrescentaria que, não obstante a excessiva e incoerente defesa de um Individualismo incompatível com um viver humano e civilizado, mesmo admitindo que o corpo à mulher pertence, o máximo que daí se poderia concluir seria ser dela o direito a impedir que aconteça uma gravidez... Sendo abusivo estender essa liberdade de determinação ao ponto de se considerar como legítimo um (suposto) direito de eliminar a Vida humana que, estando a desenvolver-se dentro dela, já não é ela, já não é dela. É já mais do que ela: é uma nova vida! Uma nova vida, humana, completa na singularidade genética que marca e distingue cada Homem, singularidade que está definitivamente definida desde a concepção. Não por razões exclusivamente estéticas ou éticas. Mas porque, cientificamente, não há dúvidas que «na falta de um infortúnio natural ou intervenção letal, o produto da concepção humana será o que toda a pessoa sã reconhece como um ser humano».

Mas, de facto, é bom recordar que não há motivo ou momento que, validamente, possa justificar o acto de tirar a vida de um inocente, fraco e indefeso. E a vida intra-uterina é vida humana, pois se «nada que não seja um ser humano se tornará alguma vez num ser humano», então «uma criança por nascer é um ser humano desde a concepção». Disso não há dúvidas. Nem civilizacionalmente, nem cientificamente. E é essa a razão da defesa da proibição do aborto: não é para punir a mulher que seria supostamente esbulhada de um direito a abortar; mas para proteger uma vida humana que a todos, através da Lei e dos actos, cabe salvaguardar, porque, como sociedade civilizada e como um todo, aos vivos e aos mais fortes é atribuído o inalienável dever e tarefa de proteger os desarmados e os inocentes, os mais fracos e os mais indefesos.
Mas sempre… e não só quando convém!

Por outro lado, seria bom que os defensores do aborto livre, quando falam da «dolorosa experiência da maioria das famílias portuguesas», assumissem a sua enorme quota de responsabilidade nesse sofrimento por, recorrente e abusivamente, confrontarem estas mulheres com o “circo” que montam à volta do tribunal, o qual proporciona um “espectáculo” que apenas beneficia os autores e actores voluntários e não aquelas que estes afirmam sempre defender. Ou seja, às graves consequências psicológicas que resultam do aborto que praticaram, os defensores do aborto livre e irrestrito decidem usá-las como supostas mártires em favor de uma pretensão que nenhuma delas acaba a defender. É manifestamente singular que muitos dos “ídolos” que, nos idos anos 70, internacionalmente sustentaram a voragem abortista, são hoje convictos defensores da Vida. Será porque descobriram que, quando se adopta uma leveza de consciência e se colocam de parte os limites morais e humanos mínimos, o custo e a dor são, a médio e longo prazo, bem maiores?
A legislação de uma comunidade não pode assentar na soma de experiências individuais, antes devendo ser a expressão compatível de uma ordem ética, moral e civilizacionalmente desejada por essa comunidade. E a nossa há séculos que optou por, nestas questões, tomar por referência o aforismo: não faças aos outros o que não querias que te fizessem a ti. Principalmente quando o indivíduo não pode decidir ou não se pode defender. Por isso, à luz deste princípio civilizacional, é inaplicável a resposta à pergunta se gostaríamos de ser punidos pela prática de um aborto, pois quem o faz, pode decidir e, consequentemente, opor-se. A pergunta mais adequada seria se, sendo um ser humano em estádio intra-uterino, defenderíamos a solução abortiva. Porque a Vida que se desenvolvia dentro da mulher que aceitou o aborto é Vida humana, indefesa, inocente e, nesta medida, está numa situação que, humana e civilizacionalmente, nos exige esforços ilimitados de auxílio, resguardo e protecção. Porque é pelos fracos, pelos inocentes e pelos indefesos que o Direito existe. Pois, o aborto é a lei do mais forte. E travesti-lo de Direito, consagrá-lo legalmente, é inverter e perverter a função da ordem jurídica. É tornar aceitável o que todos sabem ser mau. É autorizar que o mais forte elimine o mais fraco. É tornar tutelável um intolerável livre direito de disposição sobre a Vida… e, ainda por cima, a vida de outro. Pior, a vida de um outro que é fraco, inocente, indefeso. E mais grave: por aqueles que, naturalmente, deveriam ser o seu primeiro resguardo, o seu mais importante amparo, o seu mais implacável protector. Deste modo, consagrar uma lei de liberalização do aborto seria não só abrir uma porta à Cultura da morte: seria derrubar, demolir as muralhas de um modelo civilizacional que nos sustentou e defendeu nos últimos milénios.

A questão do aborto não é uma questão de gostos, opções ou moralidades: é uma questão de lealdade para com os mais fracos. Cada vez mais se cai na vivacidade das propostas demagógicas de uma “modernidade” bem-falante, que nos impõem as suas imperturbáveis certezas, fruto da sua inabilidade em distinguir o que é ilusão do que é realidade. Sobre as democracias e sobre o mundo ocidental pairam escuras nuvens da crise moral que tolda os princípios que a enformam, tornando-a incapaz de perceber a natureza da sua própria deterioração física, intelectual e moral.
Contem com quem, fiel aos Princípios, que não desiste. E resiste!
por João Titta Maurício *

segunda-feira, novembro 13, 2006

O aborto é crime!


O aborto é crime! Disso não pode haver dúvidas!
E igualmente não conheço quem possa defender que o aborto é uma coisa boa!
Assim sendo, não consigo perceber como se pode colocar a questão de saber se o aborto deveria ou não ser punível...!?!

Bem sei que as conclusões variam por estarem condicionadas pela forma como o problema é abordado, pois uns olham-no a partir da definição do momento a partir do qual há vida humana; outros preferem imaginar que pode ser olhado numa perspectiva da mulher e dos seus (supostos) direitos abortivos.
Assim, e acreditando que “água mole em pedra dura...”, tentemos, uma vez mais, demonstrar a falácia dos argumentos apresentados pelos defensores das teses abortistas.

Primeiro, ligar a vida e a felicidade futura de uma criança por nascer ao presente difícil dos pais seria condenar todas as crianças ao não nascimento!
A não ser que alguém se julgue presciente, ninguém pode saber a qualidade do futuro pela mera constatação do presente. É intelectualmente desonesto agarrar numa “mão-cheia” de exemplos, generalizá-los e tomar o todo pela parte, confundir a árvore com a floresta. Por essa ordem de ideias, alguém que haja perdido o seu emprego só teria o suicídio como natural consequência...
É verdade que é falso que só engravida quem quer e, se aceitarmos o argumento de que o aborto deve ser livremente usado como um método legítimo para evitar que surjam crianças num ambiente familiar economicamente degradado, então devemos concluir que, para os defensores da liberalização do aborto, só deverá engravidar quem pode...

Segundo, o costumeiro disparate, que afirma que “o corpo da mulher pertence-lhe”!
Entendamo-nos: estão os defensores do aborto disponíveis para autorizar a venda a retalho do corpo humano, isto é, estão disponíveis para permitir que cada um de nós possa, legitimamente, vender um rim, um pulmão ou outra qualquer parte do corpo... porque nos pertence? Se sim, podemos discutir a partir daqui, mas fica já demonstrada a incoerência argumentativa do costume... Além disso, se o corpo da mulher é dela (coisa que não duvido – ainda que tal não signifique que dele possa dispor sem limites), é dela o direito a impedir a gravidez... não o de eliminar “algo” que, sendo produzido dentro dela, não é só dela e é mais do que ela! Ou será que, para “os senhores do aborto livre”, o pai é apenas o doador do esperma? E o feto é comparável a uma borbulha? É que, usando da mesma medida demagógica, dever-se-à perguntar: quem propõe que uma mãe possa livremente “despedir” o filho, defende igualmente que um patrão possa livremente “livrar-se” do trabalhador?

Terceiros, comovidos, “os senhores do aborto livre”, falam na «dolorosa experiência da maioria das famílias portuguesas».
Concordo, se se estiverem a referir às graves consequências psicológicas que daí resultam para as mulheres que o fazem. Assusta-me a leveza com que se fala sobre o aborto: como se estivéssemos a falar de uma mera remoção de uma coisa, de um embaraço, de um incómodo. Além disso, a decisão da mulher, na maioria dos casos, não é verdadeiramente livre: sujeita à pressão das amigas, do “companheiro”, dos pais, ela acaba por optar pela solução que, aparentemente, lhe parece permitir livrar-se do... “problema”!
Não acredito que, tendo-o feito, alguma mulher disso se orgulhe. Contudo, quantos são os casos de mulheres que, quando fazem, desistem de conservar a sua condição humana, perdem os limites morais mínimos, passando a encarar o aborto como um acto normal e comparável a tomar uma aspirina! É triste e verdadeiramente sintomático do estado civilizacional a que nos querem “elevar” quando um ser humano é rebaixado à condição de... “problema”! Pois é nisso que se tornarão todas as crianças venham a ser mortas antes de nascer: no problema que, legalmente, foi removido e atirado para o caixote do lixo de um qualquer hospital!

Finalmente, no aborto é enganoso procurar vender-se a ideia de que estamos a falar de uma situação de concorrência de direitos, dum lado, o direito à Vida do ser em estado de gestação e, do outro, o direito de eliminação dessa vida. Não nos devemos esquecer – nem poder sequer tentar ousar pensar que podemos – que o direito à Vida é um direito inalienável e absoluto e que, por isso, vence sempre mesmo se confrontado com outros direitos (e mais ainda quando confrontado com supostos direitos). É uma falácia afirmar-se que a aprovação de uma legislação liberalizadora do aborto nada mais é do que o reconhecimento de um legítimo direito fundamental da mulher. Porque não só não é legítimo como muito menos poderá ser considerado fundamental. Só por uma séria e profunda incoerência no nosso sistema constitucional se pode compreender que pudessem vir a subsistir o direito à Vida (com o conteúdo tão amplo como o que está plasmado no texto constitucional português) e um direito ao aborto livre e irrestrito. È bom que se saiba: esta proposta, se fosse aprovada, seria a vitória da ignorância e do retrocesso civilizacional, pois produzir-se-ia uma imensa e grave diminuição no conteúdo que o direito à Vida possui na nossa ordem jurídico-constitucional. Este é o primeiro ataque, a primeira machadada, a primeira limitação à Vida. Começam pelo nascimento, adiando (por enquanto em 10 semanas) o reconhecimento da condição de pessoa humana. Prosseguirão pela morte, onde procurarão consagrar a eutanásia activa, antecipando o fim da protecção da vida humana em razão de uns vagos conceitos de “vida em qualidade”, “vida com felicidade”, “vida com utilidade”. Concluirão, atacando no meio, regressando às teses de eugenia – tão caras à esquerda durante grande parte do Séc. XX –, condicionando o direito de viver ao preenchimento de determinados critérios gerais de qualidades subjectivas exigidas a cada indivíduo. Nessa altura, completar-se-ia o projecto dos (ditos) “progressistas”: o Homem já não seria o que é, mas apenas naquilo que a “vanguarda progressista bem-pensante” e a lei do Estado permitissem.

Queremos viver numa sociedade onde impere o relativismo moral? Ou preferimos optar por um modelo onde vigore um padrão colectivo e homogéneo de comportamento, referencial, assente numa ideia de Homem que, pelo seu comportamento individual, assume as consequências da sua permanente aspiração a ser um Ser moral, que para tudo busca uma solução humana e civilizacionalmente aceitável.

É este o modelo civilizacional que os defensores do aborto se propõem consagrar.
É este aquele em que desejamos e merecemos viver?
Rejeitemos as propostas dos falsos humanistas, aqueles que afirmam a sua compaixão, mas que só quererem os “perfeitinhos” e aqueles que couberem no adequado número e nas adequadas condições económico-sociais por eles definidas. Assim que, a todo o momento, denunciam o seu profundo desprezo pelo sofrimento dos que nascem, preferindo-os mortos, depositados num caixote do lixo de um qualquer hospital.

por João Titta Maurício

segunda-feira, novembro 06, 2006

Dos dilemas de que a política é feita...

Cada vez que sou confrontado com a necessidade de explicar porque sou de direita (e verifico nos olhos e no comportamento do meu interlocutor um espanto e um desconforto tais que lhe adivinho a incompreensão e uma enorme reprovação por tal opção) vem-me sempre à memória o episódio do dilema de Eneias (relatado por Virgílio, na Eneida). A cena ocorre no final de um túnel que o nosso herói teve de percorrer para descer aos infernos em busca de seu pai. A certa altura, no final do caminho, é confrontado com uma bifurcação: à esquerda viram os condenados, os destinados ao fogo eterno, pois só o caminho da direita conduz, após a travessia do rio Letes, aos Campos Elíseos e à salvação.

É absolutamente frustrante observar que, quando se pretende discutir se os serviços públicos são melhor prestados directamente pelo Estado ou através de organizações geradas iniciativa privada, tudo se pretenda reduzir à oposição entre a ambição (sempre confundida com o egoísmo e sempre apresentada como negativa e eticamente censurável) do sector privado e um suposto carácter bondoso que necessariamente sempre presidiria às acções do Estado... Como se este não estivesse condicionado, por um lado, pelo interesse egoísta dos decisores políticos que, estando a prazo, querem perpetuar-se na função; e, por outro, pelo não menos egoísta interesse corporativo dos agentes e funcionários do Estado que – para a satisfação dos seus interesses pessoais – condicionam, afectam e impedem a liberdade da análise, previsão e execução das políticas públicas.
São estes, os políticos medíocres e os dependentes da teta do estado, são estes os pequenos senhores deste pequeno "pantanal" em que, desde há uns anos, se tornou Portugal, São – quase sempre! – comandados por bandalhos acomodatícios, que se vendem a qualquer poderoso, servindo a qualquer senhor, desde que lhes conservem (ou ampliem) as – sempre imerecidas e intocáveis – regalias (naturalmente pagas pelos cofres públicos, pois que ninguém, no seu juízo normal, do seu bolso lhes daria mais que mínimo o exigido à Caridade). Todavia, lá se vão safando. E conseguem-no porque, espantosamente, compreenderam como manipular a arraia-miúda. Porque os assuntos e preocupações que despertam ou assaltam o interesse da arraia-miúda não surgem inocente ou espontaneamente. Quando lhe falam a jeito, é levada a extremos, porque a arraia-miúda é, nas mãos deles, o que sempre foi: porque acéfala, não pensa; porque emotiva, age irracionalmente. Ou antes reage condicionadamente aos temas que lhe escolhem e na medida das conclusões que lhe ditam. Porque, são sempre muito poderosos os métodos e os meios daqueles que muito poderiam perder com uma turba descontrolada e, por isso, a arraia-miúda, raramente percebe a tempo que foi enganada.
Mas como é desconcertante uma revolução, uma revolta em que a arraia-miúda – uma vez mais – enfurecida e controlada "p'los do costume", adopta o ridículo traje que lhe permite julgar-se composta por "soldados da vanguarda do futuro e protectores dos direitos adquiridos no Passado”. Porém, mais não são que uma chusma produtora de um brutal vozear que, no fim das "festividades" e acabado o "picanço", acalma e, pacificamente, regressa a casa, de mãos a abanar, mais pobre, mais indefesa, mais sozinha... Deixam, então, cair os (pseudo-)cabecilhas da revolta, e os ânimos acalmam. A arraia-miúda acerca-se em redor do "patíbulo sacrificial", aplaude a "justiça" e vaia os condenados. Naquele acto de cobardia regado com o sangue da violência, a arraia-miúda liberta-se dos seus próprios crimes passados e algumas impunidades que, precisamente, são fundamento daquela sentença sacrificial. Pura ilusão ou alívio oferecidos por esta oportunidade para uma catarse: no castigo aplicado aos outros escoa-se grande parte também dos crimes e pecados alojados no seu coração.

É a meio deste caminho que está o Governo de José Sócrates. José Sócrates e este PS foram-nos vendidos, com a colaboração não despicienda (e adivinho que politicamente não desinteressada) de Jorge Sampaio – e outros! –, como um bilhete de uma viagem que, prometeram, ser condição indispensável para nos arrancar ao mar de turbulência e sacrifícios propostos pelos governos de então. Uma vez mais se provou as consequências de se aceitar tentar fugir ao Presente, ao Real sofrido e dorido que é viver, e aceitar embarcar no canto das sereias com promessas de Futuros fáceis e risonhos. Agora que a maioria tomou, finalmente, consciência que a viagem não nos transportou ao tal destino... até porque ele não existia... começou a dominar o desnorte: quantos dos que votaram no PS de Sócrates estarão entre o tal terço de portugueses que quer hoje ser espanhol? Foram iludidos, embarcaram numa viagem que a todos transportou a um apeadeiro, porventura mais complicado: ainda com os velhos problemas, com novas contrariedades e agora com menos ânimo e menos confiança.
Haverá esperança? E quando houver… sabê-la-ão conhecer? E escolhe-la-ão?
por João Titta Maurício

quinta-feira, março 23, 2006

O que penso sobre a situação no CDS

A vida exige-nos escolhas e neste Domingo não pude estar presente na Conselho Nacional do CDS porque houve razões pessoais que a política, só muito excepcionalmente, seria capaz de remeter para segundo plano. Escrevo este texto sem qualquer informe especial ou particular sobre o ocorrido. E tento apenas reproduzir o que tinha alinhavado dizer na eventualidade de poder estar presente.
O último Congresso do CDS, independentemente de quem apoiámos, foi um motivo de orgulho colectivo: foi publicamente considerado um exemplo de Democracia. Por isso, não há dúvidas quanto à legitimidade da Direcção e demais órgãos nacionais do Partido, nem qual a orientação estratégica consagrada. Perante o respeito que a todos – sem excepção! – a Direcção nacional concedeu, lógico e útil pareceria que, sem unanimismos, todos buscássemos respeitar a vontade expressa em Congresso, adoptando uma postura de harmonia construtiva, coadunável com o modo que, a seu tempo – e foi há tão pouco tempo... –, todos considerámos adequado e exigível a todos.
Há pouco mais de um ano, era motivo de pundonor que, uma vez mais, fosse claro que, também na unidade, ganhávamos no confronto com o PSD: perante o rotineiro espectáculo público de invejazinhas, mentirinhas e traições passadas em off com a colaboração dos jornalistas amigos do costume, o CDS, por comparação, mostrou-se um partido com ideias e a trabalhar em uníssono. Como uma orquestra! Eu, apesar de não beneficiar da simpatia (nem de favores) da então direcção nacional, também me orgulhei de pertencer à orquestra (ou de, pelo menos, procurar não desafinar, pois tinha – e tenho! – perfeita consciência que cada manifestação de desunião interna é um tiro – e certeiro! – que poupamos aos nossos adversários).
Parece evidente que há uma diferença de interpretação quanto ao peso, conteúdo e alcance político das legitimidades: da Direcção Nacional (obtida por vontade maioritária dos militantes) face à legitimidade do Grupo Parlamentar (obtida pela votação dos eleitores). Haverá, não obstante o respeito e garantia da autonomia política de cada Deputado, uma autonomia política para o Grupo Parlamentar? Este pleito não é nem novidade nem questão despicienda. A única, mas ligeira, originalidade poderá estar na aparente unanimidade que parece reinar entre os Deputados do CDS.
Em Democracia representativa só se pode aceitar o exercício do mandato parlamentar em Liberdade. Isto é, ao Deputado não se lhe podem impor comportamentos incompatíveis com a sua reserva de intimidade e convicções pessoais relevantes. Diferente é defender que tal permite uma autonomia plena em relação às orientações definidas pelos órgãos legítimos do Partido, adoptando agenda e estratégia próprias. Poderá não concordar com a Moção de Estratégia vencedora do Congresso. Contudo, o mandato é do Partido e um uso contrário ou não conciliável com o documento que orienta a acção do Partido é um exercício possível, mas politicamente censurável e insustentável. Se se consagrasse a interpretação da autonomia plena, como poderia um Partido estabelecer acordo s de incidência parlamentar ou governativa? Se para tudo um Partido dependesse da concordância dos Deputados, estar-se-ia a atribuir de um poder de veto sobre a decisão dos militantes. È uma solução possível... mas que é, parece-me, contrária ao espírito do sistema em vigor em Portugal.
Por outro lado, entre aqueles que apoiaram a solução não vencedora parece que predomina a convicção de que, por questões de operacionalidade e eficácia políticas, deveria caber ao Grupo Parlamentar uma espécie de exclusividade na designação dos candidatos a Presidente do Partido. É um modelo... discutível, mas é um modelo possível. Todavia, a maioria dos que estão no Grupo Parlamentar recordar-se-ão que os dois líderes anteriores foram eleitos quando nenhum deles desempenhava funções parlamentares (ao contrário do actual). E nenhum dos que então os apoiaram objectou a tal situação...
Assim, se vingar esta, então, a seu tempo, espera-se que os seus defensores também estejam disponíveis para a estabelecer estatutariamente. E para, em consentânea equidade, também estatutariamente consagrar que a escolha dos candidatos a Deputados passe, toda ela, a ser feita por deliberação livre tomada pelos órgãos distritais respectivos. Se não, o Grupo Parlamentar passaria a ser composto pelos “eleitos” do Presidente, garantindo este a inexistência de uma oposição consequente e balizando o leque de escolhas na sua sucessão. E os Congressos tornar-se-iam eventos aclamatórios, onde os delegados mais não seriam que meros “excursionistas para TV ver”!
Contudo, se para alguns faz sentido que o Grupo Parlamentar seja a única (ou privilegiada) “fonte” de onde brotam líderes do Partido, então todos deverão estar disponíveis para assumir as consequências da decisão que resultar deste Congresso. Todas as decisões e todas as consequências!
A política é um espaço que exige Coerência e Responsabilidade. Se há um tempo de discutir e um tempo de agir... há também um tempo de avaliação. Que se deseja certo e justo. Impõe-se, por isso, que entre a discussão e a avaliação impere a estabilidade, a cooperação para que «os mandatos possam ser cumpridos». Se – e bem! – considerámos injusta e injustificada a decisão do ex-Presidente Sampaio de dissolver o parlamento, a coerência a todos exige que, aos órgãos eleitos, sejam proporcionadas a regularidade e a normalidade, indispensáveis ao cumprimento do seu mandato, aceitando a conformação à execução da Moção de Estratégia que a todos governa.
O comportamento daqueles que se entendem vocacionados e se apresentam disponíveis para servir a coisa pública (esta e só esta me parece ser a causa primeira e a razão última para se estar na política) parece exigir um equilíbrio instável e difícil entre, por um lado, o interesse público e a ambição pessoal; e, por outro, a vontade de proclamar uma verdade inconveniente e o refúgio confortável da fabulação proveitosa. Há um tempo de discussão e de disputa. Para isso servem os Congressos. Depois é tempo de agir. De construir o futuro percorrendo a estrada que a maioria sufragou. Desiderato que – acredito! – todos esperam e desejam bem sucedido. Porque a todos beneficia.
Não defendo uma concordância acéfala, mas nenhum projecto humano colectivo poderá ser bem sucedido se padecer de uma permanentemente desafinação e desarmonia interna. Creio que se enganam os que julgam poder advir um vencedor num hipotético braço-de-ferro entre o Grupo Parlamentar e a Direcção eleita pelos militantes. Esta não pode senão usar da persuasão e – legitimamente! – aguardar dos Deputados o cumprimento politicamente adequado do seu mandato. E, não o obtendo, proclamar – política e publicamente – a sua censura. Por seu lado, o Grupo Parlamentar poderá recusar cumprir ou cumprir defeituosamente as orientações emanadas dos órgãos nacionais, mas a jamais deixará de dar uma imagem de desafinação em relação à vontade dos militantes. Que a todos será evidente. Que em todos fará reflectir as suas consequências. Desenganem-se os que julgam que a destruição de um “produto” da ”marca” não prejudicará outros “produtos” que mais tarde venham pretender beneficiar dela: os “consumidores” fartam-se com facilidade e voltar a ganhar-lhes a confiança pode demorar outros 20 anos...

terça-feira, março 14, 2006

Desafio para Portugal (in Diario do Barreiro)

Temos vindo a assistir, na comunicação social, a uma contínua luta e proclamação, de uma necessidade de Portugal para enfrentar o séc. XXI, por parte do líder do CDS-PP, DR. José Ribeiro e Castro. Portugal precisa de repensar a sua organização social, toda ela, começando pela base, ou seja por uma revisão da Constituição da Republica Portuguesa; não uma revisão pontual, mas uma revisão genérica e abrangente.
Comemorar os 30 anos que se celebram da nossa Constituição é ter a frontalidade de louvar as mudanças que esta trouxe de positivo à nossa vida em sociedade, mas igualmente verificar o que temos de mudar, para fazer frente aos problemas que o nosso país tem sentido, desde então.
Obviamente, considero que este foi um dos documentos fundamentais para o avanço de Portugal durante estes 30 anos e claramente que trouxe a todos os Portugueses a noção de democracia e de participação cívica. No entanto, mais importante do que esses contributos, foi, a meu ver, o sistema institucional que a Constituição nos trouxe. O sistema semi-presidencialista tem se mostrado um sistema estável e de uma saúde democrática invejável, sendo que este sistema era em 76 uma conjugação entre o presidencialismo norte-americano e o parlamentarismo britânico, o que revela, mais uma vez, a capacidade criativa do povo português.
Não obstante, todas as vantagens trazidas em 76 pelo, então texto criativo e inovador, Portugal não pode parar no tempo e é hoje função, dos actuais políticos, continuar o bom trabalho dos legisladores pós-revolucionários, adaptando esse texto ao mundo actual. Compreendo que no calor da revolução do 25 de Abril, o texto constitucional tivesse inúmeras marcas de uma ideologia socialista, ou mesmo comunista, sendo que era essa a clivagem que se pretendia fazer com o tempo de ditadura.
Esta realidade é hoje facilmente apreensível, por quem procurar conhecer as realidades politicas envoltas na revolução de 76. Contudo, após 30 anos a revolução está efectivamente concluída e efectivada, sendo que assim sendo temos hoje de preparar um texto constitucional para o séc. XXI. Nos nossos dias não é mais concebível que Portugal não possa caminhar rumo ao progresso, por estar preso a bloqueios constitucionais que o impedem. Como reconhece o actual ministro das finanças, que curiosamente é socialista, a segurança social universal, tal como a exige a própria CRP, está condenada ao fim, dada a falta de sustentabilidade do sistema, bem como esse mesmo artigo da CRP pode levar o próprio Estado português à bancarrota. Outros exemplos se poderiam tirar da CRP, tais como: o sistema de saúde publico, o sistema de educação entre outros.
Em suma, é hoje um facto incontornável que Portugal tem continuamente definhado fruto de um Estado que é demasiado pesado e que é um Estado demasiado intreventivo no funcionamento de mercado. A grande discussão é saber como pode diminuir-se o preso do Estado? A resposta a esta questão, e inclusive a saber como pode Portugal avançar no caminho do progresso, está necessariamente numa revisão à Constituição, que promova o tratamento do que é igual de maneira igual e o tratamento do que é diferente de maneira diferente, como protagonizava já Aristóteles ao definir o conceito de justiça.